A vida me trouxe a uma situação que não consigo entender.
Recordo dos tempos em que éramos crianças e brincávamos juntos.
Tá certo que você era dez anos mais velho que eu, mas como era bom.
Lembra daquela vez? Mesmo pequeno, impedi que aquele marmanjo o agredisse.
Fui pra cima dele. Não quis nem saber. E rimos muito, juntos.
Quando você viajava e me deixava só em casa, todos sabiam que eu estava lá.
Guardando nossas coisas. Às vezes até passava fome.
E quando você teve o infarto?
Se não fosse eu, o resgate nunca teria chegado.
Naquela enchente, uma catástrofe, como trabalhamos para ajudar os mais necessitados.
Você teve seus filhos e eu os meus, mas não pude ficar com eles.
Minha vida era só você.
Quantas caminhadas fizemos pela cidade.
Quantas pescarias e aventuras juntos.
Eu ficava puto quando você saía de carro sozinho.
Eu tentava ir atrás, mas como?
Por vezes dormimos juntinhos. Por vezes tomamos banho juntos.
Você cuidou muito bem de mim, eu sei.
Mas também cuidei de você.
E nunca te chutei ou acorrentei.
Não entendo porque você me abandonou, agora que estou velho e doente.
Fui recolhido da sarjeta e sei as intenções deste homem de branco.
Sei que ele vai me aplicar essa injeção letal.
Sei que não é nenhuma vacina.
Gostaria muito de vê-lo mais uma vez.
Gostaria muito de vê-lo mais uma vez.
A última.
Tenho certeza que eu abriria um largo sorriso.
De felicidade.
Felicidade por vê-lo. Por tê-lo junto a mim.
Sou seu melhor amigo.
Eu sempre o amei.
A sabedoria milenar chinesa foi quem disse que o cão é o melhor amigo do homem
Porque é o único animal que sorri quando vê o dono.
Mesmo no leito de morte.
Nunca chame um homem de cachorro
Porque ele não é nem nunca será.
Não me ofenda nem deixe que me ofendam.
Adeus, amigo!
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