quarta-feira, 30 de maio de 2012

A VOLTA


A lousa fria onde pousa meu corpo.
Ardósia maldita que enrijece-me as dobras
e desvanece a minha carcomida tez.
E essa gente, olhando pra mim, aos prantos
quando nada mais resta,
a não ser um monte de esterco
ansioso a nutrir a roda da vida
Esta, em conluio com a morte:
O contrato, a ceifa, o chorume, o pó,
a volta

terça-feira, 29 de maio de 2012

NIILISTA GRAÇAS A MIM


Sou o senhor de mim, mesmo poeira sendo
Sem avatares, sem mitos, amoral estou
Em busca de meus degraus, meu vaticínio
Longe do divino imposto outrora
Avesso a esse paraíso de mentiras
Caindo nesse abissal abismo de verdades
Sem razão, sem motivo, sem querer saber
Até o lamaçal dessa hipócrita semelhança
O silogismo sine qua non de meus hemisférios
Eu sujeito, não predicado
Meu verbo doutrina meu ser
Ser, estar, permanecer
Num cíclico e perene existir

ANTROPÓFOBO


Eu, cá em meu mundo solitudo
Solitário, abandonado, misantropo 
Quero apenas que me deixem em paz
Na paz de meus quartos escuros
Esquivo a todos vós
Na casa ao lado, gente do meu peito
Á frente, à direita, asqueroso demônio
De meus pesadelos, senhor
E esses monstros da rede a me perseguir
Sem, nem mesmo, eu saber de suas existências pífias

Já sem o amor do meu amor caio em prantos
Lágrimas tolas por um ser demérito
Gotas de uma derradeira esperança
Maculada no carcoma de seu egoísmo
Tendo que suportar seu réptil lamento
Palavras que não mais enganam
Atos que apenas provam sua humanidade
E aumentam, cada vez mais, minha antropofobia

quinta-feira, 24 de maio de 2012

OBSIDIAN


Toda a fúria do meu amor pereceu
Com todas as forças de meu coração vulcânico corri ao teu encontro
Preso no inferno profundo, sem poder te alcançar
Meus olhos buscando um oceano de vida
Ao longe, tão longe, nosso amor proibido
E a minha pressa deixou marcas
Um veio de destruição pelo caminho
Cinzas, súlfur, flores mortas
Atrás esquecidas, sem nada importar
Nuvens escuras, tormentas de fogo
Era assim meu amor por ti
E teus cânticos sirênicos, feitiço em meu ser
Então nosso encontro, derradeiro
Tu, fria
Como a água do mar glacial
Morta, ceifaste minha razão
Petrificado em teu colo restam cristais de luz
Mas estaremos juntos para todo o sempre

quarta-feira, 23 de maio de 2012

LEMBRANDO


Hoje to todo lembranças, todo tesão
Lembrando dos tempos em nossa cama
Das noites frias sob o edredom
Nossos corpos suados, cansados
Arfantes, num só gemido 
Tua pele suada por meu furor
A minha rasgada por tuas navalhas
Os beijos quentes, desesperados
Nossos fluidos misturados, nossas carnes uma só
A malícia de meu grisalho saber
A inocência de tuas penugens recentes
O teu perfume em minhas narinas enlouquecendo-me
O teu sabor em minha boca alucinada em cada poro teu
Tantos êxtases, molhados orgasmos
A ternura por dormirmos colados
A indecência por termos que levantar ao amanhecer

CREMATORIUM


Meus fluidos, agora vapores, soltos ao vento
Um monte de cinzas tristes, estáticas lembranças
Não serei um fantasma, tampouco ser de luz
Meus restos mortais espalhados na correnteza
Fruindo a magia da volta aos braços da mãe
Serei pó, longe de lápides
Concreto grotesco, burrice sem fim
Não quero uma tumba escura, gelada
Castigo hermético aos meus pecados
Aos vermes, extintos de inanição, nem a carne putrefata
Nem meu corpo morto vendido aos abutres
Breve terei de volta meu pó criador
Ao meu amor, a saudade, curta ilusão
E minha solidão findará pois, ah findará
Único não mais serei, serei tudo
Da una decepção estarei todo universo

EU MICROCÓSMICO


Esse universo exagerado que não para de luir
De tantos bilhões de galáxias, de tão distantes nebulosas
Tão escuro, tão frio, de luz que vaga sem valia
Esse cintilo que aporta nas barreiras do sem fim
A luz de anos à anos luz
Tilintando por ondas e frações do infinito
Rompendo o éter tão etéreo de escuridão
E as estrelas tantas? São bilhões
São sóis de efêmeras razões
E nosso Apolo que tudo nos dá
A verdade, una música
Sinfonia que cura, profetiza meu destino
Mesmo sendo a poeira que sou
Escorrer aos vapores do inferno
Do cio meu, espalhado pelo planeta xinfrim
Donde estarei sem meus olhos
Formando moléculas, células, pedras
Diluido em minha mãe
Na infinitude dos ventos e mares pagãos
Livre e nem sei por que 

sexta-feira, 18 de maio de 2012

ORION



Pra que naves estelares?
Tanta ciência em vão
Não vou viajar entre as estrelas
Sou um tolo
Tenho medo de avião
Mas nada me impede aos olhos cerrar
Vou viajar, voar, flutuar
Em pensamentos vou planar
As nebulosas provarei
Cada palmo de asteroide
Quem explica?
Ninguém!
Nem Freud
Navego fácil quando quero
Seja no impressionismo de Melina
Ou na sandice e solitude de Marcela
Rumo às Alterosas de Isabella
Em seus cachos, seu riacho
Seus picos, seus desejos
Seus beijos de arrancar o fôlego
Fecho os olhos e lá estou
Vejo Ulisses, brindo Agamenon
Minha mente meu transporte
Teleporte quiçá
Porque não, então
Pelas nuvens, sóis e ruas de Orion



SANATÓRIO



Pesadelos desdobrados em voo cego
Fazendo amor com minha mãe
Agora Édipo
Ao corar do parlamento em decoro
Abrem-se as cortinas
E a máscara deixa à luz apenas olhos azuis
Seringas violentas em meus braços violetas
Já roxos, rotos desse ópio a me calar
As chagas, pestilência tatuada
O pulso em burburinho, trançando as pernas
Como tridente em meus olhos
Blackout!
Inferno!
A forja da razão desse placebo radiativo
Droga circuncisa em meus pensamentos
Fome! Vou definhar até viver de excrementos
Merda! Prisioneiro, não de minha razão
Escravo das regras malditas
Benditas ao rebanho de plantão
Agora sim compreendido
Insano. Interno. Esquecido
Louco de dar dó, mas curado
Esperando a eternidade neste sanatório
Cavalgando rumo ao apocalipse

EUTANASIA


Essa luz que me cega
No fim do túnel a me iludir
Olho pra trás e vejo o passado
E nele a luz não está
Meus livros, meus filhos.
Meus amores
Amantes em vão, amados à exaustão
Sorrisos em eco
Lágrimas em cascata
Décadas, amigos
Ágatas, decepções
Toda essa poesia entalada em gritos
Soltos ao vento a cada amor
Minha língua que tanto feriu aos incautos, hipócritas
Essa gente sem ouvidos, sem sentidos
Essa gente sem noção
E agora, no prazer da dispersão de meus átomos
Pelo universo afora ansiosos
Acuados pelo led vermelho que pisca
Forjando o ritmo da minha arritmia decrépita
Por favor!
Libertem a linha reta desse zunido final!

quarta-feira, 16 de maio de 2012

REDUZIDO A UMA BESTA


Tanto amor de minha mãe à luz de meus dias
Da infância imberbe, inocência indelével
De querer aos irmãos todo o bem
Todos os sorrisos merecidos extirpados,
ante a tirania daquele dito pai,
feito ogro de incessantes pesadelos
Na shangri-la de meus livros, encantos
Do saber esfuziante, a alegria na busca
No encontro o prazer
À doutrina travestida de santa refeição
Os louros poucos, o ouro farto
E de tantos sonhos, aqueles da rebeldia francesa,
tantos enganos, 
enfadonhos deslizes
A mídia, o clero, o poder
O destino de minha humanidade pífia reduziu-me a uma besta

SANTÂNICA EVIDÊNCIA



Pedofilia clérica
Evangelia clepta
Cinismo ecumênico
Holocaustos tantos em nome de tantos senhores
Crianças famélicas, rotas, desgraçadas
O divino, inerte, do alto de seu fétido trono
Satan é, sem dúvida, um fraco
Café pequeno ante essa corja